sábado, 31 de maio de 2008

Os riscos do retorno da inflação e seus reflexos sobre as relações de trabalho


por Antônio Augusto de Queiroz*


O Brasil vive um momento singular de sua história, com uma tríplice combinação: democracia, crescimento econômico (com estabilidade de preços e distribuição de renda), e consciência ambiental, como bem pontuou o consultor sindical e membro do corpo técnico do DIAP, João Guilherme Vargas Netto.

Uma das pernas desse tripé, entretanto, está ameaçada pela pressão internacional sobre alguns preços, o que poderá justificar medidas preventivas contra o retorno da inflação com reflexos nas relações de trabalho.

A ameaça decorre de um verdadeiro choque, em nível mundial, nos preços de petróleo, de alimentos e de commodites, com pressões inflacionárias muito fortes, inclusive no Brasil. Embora o País seja beneficiário direto do aumento desses preços, já que é grande produtor e exportador dos três itens, a população, em geral, e, os assalariados, em particular, poderão ser penalizados com a reação da equipe econômica e do Banco Central no enfrentamento da ameaça de inflação.

O assunto não ganhou grande destaque nos veículos de comunicação, ainda, mas os ''analistas'' já antecipam possíveis medidas de combate à inflação, entre as quais um profundo corte nos gastos públicos (despesas com pessoal e previdência) e aumento do superávit primário e das taxas de juros. Outros, adversários da distribuição de renda, já especulam que os salários da iniciativa privada têm crescido mais que os ganhos de produtividade (em alguns setores da economia) e que isto teria efeito inflacionário, insinuando que deve haver desaceleração nos ganhos reais nas negociações coletivas.

De fato, se for confirmada a tendência de crescimento da inflação (e será em nível planetário), independentemente das medidas que o ministério da Fazenda e o secretário do Tesouro venham a tomar, o Banco Central do Brasil, que possui autonomia operacional, não terá nenhuma dúvida em arrochar a política monetária e aumentar os juros no País, com reflexos desastrosos sobre a cadeia produtiva em geral e o mundo do trabalho, em particular, tanto dos servidores públicos quanto dos trabalhadores do setor privado.

Para os servidores, o reflexo seria, além de congelamento salarial após o realinhamento em curso, uma maior pressão para aprovar o pacote de maldades que se encontra no Congresso: PLP 1, PEC dos Precatórios, Lei de Greve, Fundações Públicas com contratação pela CLT, demissão por insuficiência de desempenho e previdência complementar privada, entre outros.

Para os assalariados, além do risco de negociações com mera reposição da inflação, colocaria em risco a aprovação da convenção 158 da OIT, do projeto que põe fim ao fator previdenciário, além de diminuir as chances de sucesso da campanha pela redução da jornada (para 40 horas semanais) sem redução de salário.

Trata-se, por enquanto, de mera tendência e com reflexos em todo o mundo, não havendo razão para o Governo colocar em risco as conquistas econômicas e sociais acumuladas. As autoridades não podem nem devem se apavorar, tomando medidas que inibam o consumo, o emprego e as negociações salariais, nem tampouco aumentem, artificialmente, mediante majoração das taxas de juros, o endividamento das famílias. O momento requer muita prudência.

*Antônio Augusto de Queiroz, Jornalista

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